Uma história curta


 

Meus pés tocam o chão frio ao pular da cama e me enfiar na roupa que tirei do armário na noite anterior. Coloco queijo numa fatia de pão ao mesmo tempo em que ajusto a velha Fjallraven preta em meus ombros. Pego meu casaco pendurado no cabideiro, enquanto meus olhos procuram pelo par de Adidas que sempre deixo ao lado da porta. Saio de casa antes do sol raiar e colorir o céu azul. Assim que a brisa fresca toca meu rosto, fecho os olhos e tomo uma respiração profunda, agradecendo por mais um dia de verão. A passos largos desço os degraus em direção a rua, três deles rangem alto. Faço uma anotação mental para não esquecer de avisar os novos moradores. "Todos seguros em suas camas", penso, observando a quietude da manha. Coloco meus fones de ouvido e deixo que meus dedos rolem pela tela do celular a procura de alguma música nova, mas velhos hábitos são difíceis de mudar. Escolho a playlist de todos os dias. Conforto é um sentimento agridoce.

"Bite your tongue
Dont make a scene dear
Everybody s been here
At least once before"

"Pertinente", Kings of Leon arranca um sorriso dos meus lábios, enquanto sigo em direção ao centro de Oslo.

Aker Brygge está cheio de vida. Pessoas desembarcam das balsas para iniciarem o dia de trabalho na cidade, enquanto outros acordaram cedo para aproveitar o dia de sol nas ilhas. Sentirei a falta desses lugares especiais em Oslo. As vezes os sinto como se fossem uma pessoa atravessando a rua para me fazer companhia. Você provavelmente está se perguntando o que estou fazendo aqui. Estou observando. Uma noiva usando vestido branco sai do banco traseiro de um Mini. A fotógrafa diz entre sorrisos, "estou muito feliz por podermos aproveitar a luz da manha". Tiram uma foto em que o noivo, de cabelos compridos e terno azul marinho, entrega o buquê para a noiva, que ri como o gato da Alice. Provavelmente a fotógrafa ja viu aquela mesma expressão em centenas de outros rostos. Sorrio também. Talvez aquela foto será colocada numa moldura sobre a lareira e assim permanecerá até que alguém a substitua por fotos de uma família maior. Penso em meus pais, eles estão juntos há trinta anos. Sinto a falta deles. "Cuidado para não cair! Atenção! Cuidado para não tropeçar! Obrigada", fala a fotógrafa por cima da câmera .

Um celular apita desviando minha atenção.
"Espero que não tenha tomado café da manhã sem mim ;)", a mensagem de David me faz sorrir.
"Te encontro no lugar de sempre?" Meus dedos apressados digitam a resposta.
"Guarde o meu lugar. s2"

Demora alguns minutos para eu conseguir uma mesa livre. Todos querem aproveitar a luz do sol. Tomo o primeiro gole de café. Então, o vejo. Cabelos castanhos, despenteados como de costume. Nariz proeminente, olhos azuis brilhantes, que destacam ainda mais a cicatriz abaixo do olho direito. Poucas vezes o vi sem barba. Impossível não nota-lo com sua pele morena e seus um e noventa e um de altura. Sinto meu coração apertar quando ele sorri e me abraça. "Sentirei sua falta", digo em minha mente. Então, o abraço apertado.


Comentários

  1. De uma profundidade tremenda. Como existem pessoas especiais e que nos querem bem, não é mesmo?!

    Boa semana!

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    Até mais, Emerson Garcia

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